sábado, 12 de setembro de 2009

meu medo é mudo

-E o seu? Qual é seu medo?
-Tenho um pesadelo recorrente. Sonho que fico muda. Desde pequena.


Este é um texto atípico. Este é um querido-diário. Este é um são duas da manhã e eu quero gritar, mas são duas da manhã.
Que fossem duas da tarde, eu já não grito mais.
E é esse meu desespero, meu pesadelo de infância.

Meu pesadelo de incomunicação só não é o de ser surda, cega, gélida por que o único sentido que eu posso conhecer a mim mesma é pela minha fala. Eu consigo conhecer o mundo só com olhos, só com ouvidos, só com o tato, só com o cheiro.
Mas sem um espelho, não me adiantam os olhos. Meu cheiro eu nem sinto, tatear a mim mesma é tão metasinestésico que é em vão. Mas quando eu falo, eu falo e não apreendo nada do mundo. Eu não vejo se o que tem na minha frente é um prédio, não sinto se ele cheira a construção ou se sua parede é áspera.
Quando eu falo não me importa o mundo
Quando eu falo é egoísmo, é pra eu me apresentar, a mim mesma.

Me tirassem todos os sentidos, minha fala não. Minha mudez é
atrofia da alma que se diz estar em mim.

Esse ano eu tenho odiado meu guarda-roupa. Ano passado, mesmo com supraquilos extras, eu me virava e me vestia. Esse ano eu não me identifico com o que era meu. Tem algos errados acontecendo comigo, sei disso. São algos sérios, bons ou ruins eu não sei, mas são muito abaláveis.

A ponto de eu chorar por absolutamente tudo. Já tentei acompanhar meu ciclo hormonal pra ver se não é por isso que eu choro, nos cinco últimos dias do ciclo. Não, não.
Choro quando vejo a melhor cena que sempre amei, a de dois irmãos de mãos dadas. Chorei quando o Luciano Hulk (sim) entregou uma casa reformada pra uma família que adotou um moleque. Chorei cara, chorei esse ano. Chorei pela casa e pelo meu guarda-roupa, por motivos completamente opostos e idiotas.
Que merda ta havendo comigo?

Tem gente querendo tapar minha boca. Lá pros meus nove anos, não sei, quando passava Família Smith na Tv Cultura, eu sonhei que meu pai me deu um tapa na boca e minha boca sumiu.
O mundo tem dado tapas na minha boca toda hora, e eu cheguei ao ponto de...
Eu mesma estou dando tapas. Eu.

Estou enfrentando aquilo que sempre abominei: comodismo, preguiça. Não tenho achado, ou agarrado, forças para lutar contra minha mudez.
-Hein filha, você acha que te falta algo?
-

Eu estou aprendendo o maior pecado que minha alma diz, estou aprendendo o silêncio.
Fui acusada de histeria. De fato, EU COMEÇO A FALAR DESCONTROLADAMENTE NUMA VERBORRAGIA INFINDA PRA EU NÃO MORRER ENGASGADA COM MINHA NECESSIDADE DE FALAR.

Demorei pra começar a falar quando bebê, mas eu compensei quando cresci. Não é luxo falar, é necessidade.

E cada vez que você me fala e me manda ficar quieta, minha boca encrava tudo o que pensei em dizer. E um dia esse encravado inflama, forma pus e o pus explode e eu GRITO perco os sentidos, todos eles viram o sentido da fala.
Falar é minha sanidade e minha insanidade.

Mas eu só tenho ficado insana, e de insana, estou ficando muda!!muda, meu Deus!
Estou há tempos sem falar comigo mesma antes de dormir, sem fantasiar de sair voar com o menino dos meus sonhos, sem escrever uma loucura qualquer, sem escrever o que meu dedos sempre mandavam. Até meu dedos estão num período de entresafra, não tenho achado o princípio ativo e o tesão para escrever.

Basta que me abalem, num sermão de família ou numa tarde chorando na tevê para que meus dedos se apertem nesse teclado sem que eu perceba pra me dizerem que o dia que eles se sentirem abandonados,
eles é que vão apertar minha boca com muita raiva que eu me cale de vez.

Não sei quão perigoso isso pode ou deve soar, mas eu estou me mudificando.
e quero gritar por socorro, ou desistir.

7 comentários:

Anônimo disse...

Te entendo. Você com seu silêncio e eu com o meu, nada vai acontecer. Precisamos sim gritar, ser insanos, sermos nós em disparada. Eu continuo chorando até em noticiário do Jornal da tarde. Chore, ontem eu chorei, e continuo sendo um homem de 26 anos, formado e indeciso.Outras pessoas são decididas não formadas e choram. Mas e ai? Continuo sendo o mesmo como tantas outras são.

Sem amor ninguem é nada. Amar as coisas como são.. saca? Elas são como são. Gostamos do que gostamos. Decisões feitas para agradar sonhos de alguém não rola. viver oque temos vontade de viver, cada um tem a sua.

bjoo

2do disse...

Falamos para sermos ouvidos. Se o ciclo não se fecha, exaurimo-nos na vã tentativa de. Impulsos mtas vezes afastam pessoas. Reserve um tempo para si e para outrem. Aí discorram alhures enigmas sofismas incompreensões! Tudo a que tem direito. Sinta o afeto dessa companhia... falada! Ouvida. Só não jogais poemas ao relento, pois estes poderão não saber o caminho de volta... a incompreensão alheia pode assim te trazer a incompreensão interna. good luck!:)

Unknown disse...

Como teu irmão, que te conhece mais do que ninguém, e com a certeza de ser conhecido mais do que ninguém por você, te digo: falar por si só não te faz ser ouvida.
Conheço tuas falas, conheço teu raciocínio, conheço o que pensa, conheço o que te aflige.
Gritar não te liberará dos teus medos, falar sobre eles não os fará sumir.
Falar, verborragicamente e até histericamente, como você mesma citou, de nada adianta. Não é uma verdade agradável, mas elas quase nunca são.
Lembra do filme do Baba Aziz? O que o príncipe fez para limpar toda sua alma e se tornar um homem íntegro? Falou? Conversou? Gritou? Não, Laylinha. Ele simplesmente contemplou sua imagem, e por ela, seu interior, seu cerne, seu espírito, suas estruturas e falhas. Meditou sobre si e ficou cego. Cego para o mundo, mas abrindo uma visão muitíssimo maior e mais louvável para sua alma.
Daí para frente, resolveu as questões que o abalavam, se livrou das tormentas e findou sua vida em plenitude consigo mesmo.
A questão, não é ter o dom ou a sabedoria de se expressar pela fala, e sim, a de usá-la para objetivos específicos e finitos, como fazia Baba Aziz. O refletir do ancião superou em muito a perda da visão. O príncipe, além de cego, tornou-se silencioso, mas um silêncio tão aprazível que só não se absteve da fala por precisar se comunicar minimamente.
No seu caso, minha amada irmã, emudeça-se, para o mundo, converse com sua alma, grite com seu coração. Chore, sim, pois o choro é a mais crua e verdadeira expressão da essência, mas chore em silêncio. Se puser o choro em palavras, perde-se o valor.
Lembra que a cada lágrima que derramar sobre teu reflexo na água, a fará reverberar por um instante, e até distorcer tua imagem por algum tempo. Mas logo tua alma se restabelece e, ainda, tem seu recipiente acrescido por mais uma gota d’água. Quando esse recipiente estiver cheio de todas as tuas lágrimas, já não haverá mais motivos para chorar, esgotar-se-íam todos, e tua imagem estará mais límpida e verossímil do que jamais esteve.
As palavras são feitas do mundo e puramente para o mundo, teu espírito é muitíssimo superior a quaisquer consequencias trazidas por elas, mesmo que teoricamente resolutivas. Novamente, palavras não destruirão teus problemas, tua reflexão sim. Ame a si, ame tua alma, não ame as palavras, seja qual for a forma delas.
Do teu irmão que tanto te ama
Anwar

Rafael Cunha disse...

Você não sabe o alívio que me dá ao te ver por aqui. Muita alegria.

Anônimo disse...

Eu sou seu R. Vc me joga me esquece. Sinto sua falta. bjos rafa

Phenobarbital disse...

Dificilmente se ouve o grito, mas o silêncio... o silêncio é sentido.
Sinto muito!

Maria Carolina disse...

Nao existe pesadelo pior que a incomunicaçao. Nao tem sentido falar por falar,é preciso falar daquilo que minimamente se sente,se aprendeu,e pode ser dito a alguem, um alguem qualquer que vai ouvir. É relativamente egoista e limitado, mas é o máximo de alcance e de liberdade tao necessária,interior.
De toda forma,a comunicaçao é algo absolutamente fundamental, ainda assim a voz é a melhor saúde,a pura liberdade,a verdadeira força; A humanidade faz sons antes de gestos e sutilezas, o desespero do som próprio encolhido a si mesmo expresso no sutil som de uma caneta ou do teclado,e decai no som de choro também engolido.

Comunicar é fundamental, falar é soltar a alma,sendo algo profundo ou imbecil,até mesmo sem alcance,sem qualquer comunicaçao. Comunicar é o objetivo, a fala termina apenas como arte, a expressao pura e sincera dada por todos os sentidos e sentimentos aglomerados em um som.

=**