sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Subo a Serra indo ao trabalho
-Não da pra subir, moça, acabou de capotar uma caminhonete.
Esqueço de perguntar como está a pessoa, afoita em chegar no horário
Segundos depois de Serra-abaixo, penso como posso ter sido tão insensível
Doeu
Cheguo atrasada, alguém ajudou em me cobrir
Foram onze horas de sensação de caminhonete capotada, lapsos de tempo entre fichas de papel e fichas caindo dentro de mim.
- Dra, estou vindo desde segunda com pressão alta, diz ela.
Traz a filha, que saiu após uns quinze minutos a pedido da mãe quando lhe perguntei 'passando por alguma emoção em casa?'.
Moça bonita, olhos opacos, fala sem abalos sobre tudo o que toma da vida e de medicamentos. Triste história em casa
mas foi outro o CID que meu histórico do google decidiu me relembrar capote abaixo. 'Violência sexual' acabou sendo o tema da consulta, apesar de sua vida estar lhe estapeando a cara há anos.
Serra a cima novamente, caminha no fio de acostamento uma silhueta feminina carregando silhueta de neném. Voltavam de outro hospital, graças a Deus ela me confiou uma carona. Caminharia 5km até um orelhão.
Quando parei o carro, olhando pelo retrovisor para que ninguém chegasse dirigindo pela curva, senti que eu pudesse servir-lhes como uma heroína, salvadora do perigo.
Eles não tinham medo, não lhes havia perigo, não me havia ato heróico
Me cabia era a honra de ver uma criança tomada de benzetacil que dormia calma no calmo colo da mãe
Jovem aos seus vintes sentou ao lado da balança cuja outra ponta estavamos eu e a outra, do CID.
Equilibrou-se tudo.