quinta-feira, 29 de maio de 2014

não sei se a autora sou eu




a dor de perda é dor imensurável
inimaginável enquanto se antecede a ela
dilacerante, teatral, só na boca do estômago, só na roupagem, em toda a alma, 
ou toda dento do bolso da frente da camisa que a moça já desceu pra lavar

pior ainda é quando é uma dor-sem-dor
perda-sem-saber
ida-sem-ser notada
fugaz como o desabotoar da camisa e seu destino a girar e ser lavado na água

e deve mesmo, ser lavado
de preferência, sem que seja na impessoalidade da máquina de lavar roupa
e da mocinha que tem trabalhado aqui há um tempo

dor é pra lavar no tanque.
é não desperdiçar sabão
é não desfocar da dor
segurar bem forte a camisa
mirar a mancha
e esfregar, um atrito e um carinho

notar a cor que escorre da água:
essa se contamina em sacrifício a seu desejo,
enquanto você não sacrifica muito quando limpa por querer limpeza em troca

uma perda.
sofrimento algum faz sentido do qual não se tire algo de bom
que se torça o pano até que as últimas gotas desçam pálidas.

O oceano, logo logo, se recicla.