o que aconteceu foi
que temi te amar
temi que, te amando, te destruiria
afinal, uma hora você estava
na outra, partia
achei que a cada partida me dilacerava
talvez fosse uma vingança, um castigo? e já alia nascia
em mim a noção de pecado
(ou assim mais tarde fui nomear algo já familiarizado)
não quis me sentir digna
não quis nunca mais botar pra dentro
algo que vinha tão sincero
tão humano
tão materno
passei e ainda passo anos
em que, sempre respondendo mal a todo tipo de restrição,
compensava, compulsivamente, arrecadando tudo aquilo que insisti em descartar
e bota pra dentro, bota pra fora
pra dentro de novo, pra fora de novo
até chorar
até sangrar
linda e metaforicamente
a vida vai se manifestando
e agora vejo, percebo, ilumino
(mas, tenha paciência, aos poucos elaboro)
o quanto eu quis ser medonha
por ser medrosa
por ser voraz
por ser insaciável
por ser frágil
por ter inveja
por ter um horripilante temor de sucumbir
me perdõe
por esse amor que rejeitei
persistentemente empurrei da cama
lamento muito, até o asfixiei
fui bruta, precisei ser
sentia que estava me defendendo de algo que eu não suportaria
e hoje me pergunto
será que amor é mesmo um perigo tão grande que eu não possa tocar?